O Que Acontece com Bens Financiados no Divórcio?
- Maísa Lemos
- há 6 dias
- 8 min de leitura

Por Maísa Lemos, advogada especialista em Direito de Família
O fim de um casamento traz consigo não apenas questões emocionais, mas também desafios patrimoniais complexos. Entre eles, um dos mais frequentes é: o que fazer com os bens que ainda estão sendo pagos? Imóveis financiados, veículos em parcelas e outros bens adquiridos durante a união podem se tornar verdadeiros quebra-cabeças no momento da separação.
Neste artigo, vou explicar detalhadamente como funciona a divisão de bens financiados no divórcio, quais são seus direitos e as melhores estratégias para resolver essas questões de forma justa e equilibrada. Afinal, entender como lidar com bens financiados no divórcio pode fazer toda a diferença para seu futuro financeiro.
Sumário:
Entendendo o regime de bens e sua influência nos bens financiados
Antes de discutirmos especificamente sobre os bens financiados no divórcio, é fundamental entender como o regime de bens escolhido no casamento influencia diretamente a divisão patrimonial.
No Brasil, temos quatro regimes principais:
Comunhão Parcial de Bens: Regime padrão quando não há pacto antenupcial. Nele, os bens adquiridos durante o casamento são considerados comuns, independentemente de quem pagou ou em nome de quem está o financiamento
Comunhão Universal de Bens: Todos os bens, anteriores e posteriores ao casamento, pertencem igualmente ao casal, salvo exceções legais.
Separação Total de Bens: Cada cônjuge mantém a propriedade exclusiva de seus bens, tanto os anteriores quanto os adquiridos durante o casamento.
Participação Final nos Aquestos: Durante o casamento, aplica-se o regime da separação de bens; na dissolução, cada cônjuge tem direito à metade do patrimônio adquirido onerosamente na constância do casamento.
É importante destacar que o nome que consta no financiamento não determina necessariamente quem é o proprietário do bem. O que importa é o regime de bens e quando o bem foi adquirido.
Bens Financiados no Divórcio: o que diz a lei?
Quando falamos de bens financiados no divórcio, o Código Civil brasileiro estabelece princípios importantes que norteiam a divisão patrimonial:
Princípio da Meação: Nos regimes de comunhão (parcial ou universal), os bens comuns devem ser divididos igualmente entre os cônjuges, independentemente de quem realizou o pagamento das parcelas.
Princípio da Boa-fé: As negociações devem ser conduzidas com transparência e honestidade, evitando ocultação de bens ou dívidas.
Princípio da Função Social da Propriedade: Em casos envolvendo a residência familiar, o juiz pode considerar fatores como a guarda dos filhos para determinar a destinação do imóvel.
A jurisprudência tem entendido que, em regimes de comunhão, mesmo que apenas um dos cônjuges continue pagando as parcelas após a separação, os direitos sobre o bem continua pertencendo a ambos nas proporções do que foi pago durante o casamento e após a separação.
Atenção: Muitas pessoas acreditam que, se o financiamento está em seu nome, o bem lhes pertence exclusivamente. Isso é um equívoco que pode gerar sérios problemas no divórcio.
Imóveis Financiados: principais desafios e soluções
Os imóveis financiados representam um dos maiores desafios nos divórcios, principalmente porque envolvem valores expressivos e contratos de longo prazo. Vamos analisar as principais opções disponíveis:
Venda do imóvel e divisão do valor
Esta é frequentemente a solução mais indicada aqui em nosso escritório. O casal vende o imóvel, quita o financiamento pendente e divide o valor restante conforme o regime de bens.
Vantagens:
Encerra definitivamente a relação patrimonial
Permite que ambos recomecem sem vínculos financeiros
Evita conflitos futuros sobre manutenção e valorização do bem
Desafios:
Pode haver perda financeira se o imóvel for vendido às pressas
Questões emocionais, especialmente quando há filhos envolvidos
2. Um dos Cônjuges Assume o Financiamento
Nesta opção, um dos cônjuges fica com o imóvel e assume integralmente as parcelas restantes, compensando o outro pela sua parte.
Como funciona na prática:
É necessário calcular o valor já pago e o saldo devedor
Determinar quanto cada um tem direito
O cônjuge que ficará com o imóvel deve compensar o outro
É preciso transferir o financiamento para o nome de quem ficará com o imóvel
Importante: Esta transferência necessariamente exige aprovação do banco ou instituição financeira, que avaliará a capacidade financeira do cônjuge que assumirá a dívida.
3. Manutenção da Copropriedade até a Quitação
Em alguns casos, o casal opta por manter a copropriedade do imóvel até a quitação do financiamento, estabelecendo regras claras sobre quem pagará as parcelas e como será feita a divisão futura.
Esta opção é mais comum quando:
Há filhos que continuarão morando no imóvel
O mercado imobiliário está desfavorável para venda
Nenhum dos cônjuges tem condições de assumir sozinho o financiamento
Alerta: Esta solução mantém o vínculo patrimonial entre os ex-cônjuges por longo período, o que pode gerar conflitos futuros. É essencial que todas as condições sejam detalhadamente documentadas no acordo de divórcio.
Veículos financiados: como proceder?
Os veículos financiados seguem princípios similares aos imóveis, mas com algumas particularidades:
Depreciação acelerada
Diferentemente dos imóveis, que tendem a valorizar, os veículos depreciam rapidamente. Isso deve ser considerado no cálculo da divisão.
Exemplo prático: Um carro financiado em 60 meses, após 24 meses de pagamento, já perdeu aproximadamente 30-40% do seu valor original, enquanto apenas 40% do financiamento foi quitado.
Opções para Resolução
Venda do veículo: Liquidar o bem, quitar o financiamento e dividir o valor restante (se houver)
Transferência para um dos cônjuges: Quem ficar com o veículo assume as parcelas restantes e compensa o outro cônjuge pelo valor já pago
Troca por outros bens: O veículo pode entrar na negociação global, sendo compensado por outros itens do patrimônio comum
Dica importante: Verifique sempre se o contrato de financiamento permite a transferência do bem. Alguns contratos têm cláusulas restritivas que podem impactar significativamente a negociação.
Estratégias para Negociação de Bens Financiados
A negociação de bens financiados no divórcio requer planejamento e estratégia. Aqui estão algumas abordagens que têm se mostrado eficazes:
Avaliação profissional dos bens
Antes de iniciar qualquer negociação, é fundamental ter uma avaliação precisa do valor atual dos bens financiados. Isso inclui:
Valor de mercado do bem
Saldo devedor atualizado
Valor das parcelas já pagas
Estimativa de valorização ou depreciação futura
Por que isso é importante? Negociar sem conhecer os valores reais pode resultar em acordos injustos e prejuízos significativos para uma das partes.
Compensação com Outros Bens
Uma estratégia comum é compensar a parte do bem financiado com outros itens do patrimônio comum.
Exemplo: Em um caso que acompanhei, o marido ficou com o apartamento financiado (assumindo as parcelas), enquanto a esposa recebeu integralmente outro imóvel já quitado de valor semelhante à parte que lhe caberia no apartamento.
Pagamento Parcelado da Compensação
Quando um dos cônjuges não possui bens suficientes para compensar imediatamente o outro, é possível estabelecer um cronograma de pagamentos.
Como formalizar: Este acordo deve ser detalhadamente documentado no divórcio, incluindo valores, datas, forma de pagamento e consequências do inadimplemento.
Refinanciamento para Quitação de Parte
Em alguns casos, é possível refinanciar o bem para obter recursos e quitar a parte do cônjuge que não ficará com ele.
Atenção: Esta opção deve ser cuidadosamente analisada, pois pode resultar em condições menos favoráveis de financiamento e custos adicionais.
Quando o financiamento está apenas no nome de um dos cônjuges
Uma situação comum que gera muitas dúvidas é quando o financiamento está apenas no nome de um dos cônjuges. O que acontece nesse caso?
No Regime de Comunhão Parcial
Se o bem foi adquirido durante o casamento, ele pertence a ambos os cônjuges, independentemente de em nome de quem está o financiamento. Isso significa que:
O bem deve ser partilhado conforme as regras do regime
A dívida também deve ser considerada comum
Ambos têm responsabilidade sobre o pagamento das parcelas
Caso ilustrativo: Representei uma cliente cujo apartamento estava financiado apenas no nome do marido. Durante o divórcio, ele argumentou que o imóvel lhe pertencia exclusivamente e que só ele teria pago as parcelas. O juiz, no entanto, reconheceu que o bem era comum e determinou sua partilha, uma vez que foi adquirido na constância do casamento sob o regime de comunhão parcial.
Transferência do Financiamento
Um desafio prático nestes casos é a transferência do financiamento para o nome de apenas um dos cônjuges. Este processo envolve:
Aprovação da instituição financeira.
Nova análise de crédito
Possível alteração nas condições do contrato
Custos de transferência e registro
Dica profissional: Antes de definir quem ficará com o bem financiado, consulte a instituição financeira para verificar a viabilidade da transferência e os custos envolvidos.
O Papel da Mediação na Resolução de Conflitos Patrimoniais
A mediação tem se mostrado uma ferramenta extremamente eficaz para resolver questões relacionadas a bens financiados no divórcio. Diferentemente do processo judicial tradicional, a mediação permite:
Soluções personalizadas que atendam às necessidades do casal.
Preservação do diálogo e redução da animosidade
Economia de tempo e recursos financeiros
Maior probabilidade de cumprimento dos acordos
Como funciona na prática: Em sessões de mediação, um profissional neutro auxilia o casal a explorar diferentes alternativas para a divisão dos bens financiados, considerando aspectos práticos como a capacidade financeira de cada um, necessidades habitacionais e projetos futuros.
Perguntas Frequentes Sobre Bens Financiados no Divórcio
O banco pode se recusar a transferir o financiamento para apenas um dos cônjuges?
Sim. A instituição financeira realizará uma nova análise de crédito e poderá recusar a transferência se considerar que o cônjuge não tem capacidade financeira para arcar com as parcelas. Neste caso, será necessário buscar alternativas, como a venda do bem ou a manutenção da copropriedade.
Se o financiamento continuar no nome dos dois após o divórcio, quais são os riscos?
Responsabilidade conjunta pelo pagamento (se um não pagar, o outro será cobrado)
Impacto no crédito de ambos em caso de inadimplência
Necessidade de concordância mútua para venda ou refinanciamento
Dificuldade para obter novos financiamentos individualmente
É possível que um dos cônjuges continue morando no imóvel financiado enquanto o outro paga as parcelas?
Sim, é possível, mas esta situação deve ser cuidadosamente documentada no acordo de divórcio, especificando:
Se o pagamento é considerado uma forma de pensão ou compensação.
O que acontece quando o financiamento for quitado
Como será feita a divisão em caso de venda futura
Responsabilidades sobre manutenção, impostos e condomínio
O que acontece se o bem financiado foi adquirido antes do casamento, mas as parcelas continuaram sendo pagas durante a união?
Neste caso, a solução depende do regime de bens:
Na comunhão parcial, o bem pertence exclusivamente a quem o adquiriu, mas pode haver direito à compensação pelas parcelas pagas com recursos comuns
Na comunhão universal, o bem integra o patrimônio comum, independentemente de quando foi adquirido
Na separação total, o bem pertence exclusivamente a quem o adquiriu
Como calcular o valor da compensação quando um dos cônjuges fica com o bem financiado?
O cálculo deve considerar:
Valor atual de mercado do bem
Saldo devedor atualizado
Valor das parcelas já pagas durante o casamento
Proporção da contribuição de cada cônjuge para o pagamento
Fórmula simplificada:
Valor da compensação = (Valor de mercado - Saldo devedor) ÷ 2
Observação importante: Esta fórmula pode variar conforme o caso específico e o regime de bens adotado.
Conclusão: Planejamento e Assessoria Jurídica são Essenciais
A divisão de bens financiados no divórcio é um processo que requer planejamento cuidadoso e conhecimento jurídico especializado. Cada caso tem suas particularidades, e as soluções devem ser personalizadas para atender às necessidades específicas do casal.
Ao enfrentar esta situação, lembre-se de que decisões precipitadas podem resultar em prejuízos financeiros significativos e conflitos prolongados. Por isso, buscar orientação jurídica especializada é fundamental para garantir que seus direitos sejam respeitados e que a divisão patrimonial seja justa e equilibrada.
O divórcio já é um momento emocionalmente desafiador. Não permita que questões patrimoniais mal resolvidas se tornem um fardo adicional em sua vida.
Com planejamento adequado e assessoria jurídica competente, é possível encontrar soluções que permitam a ambos os cônjuges seguirem em frente com segurança financeira e tranquilidade.
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Sobre a autora: Maísa Lemos é advogada especialista em Direito de Família com 22 anos de experiência. Mãe de três filhos, apaixonada por literatura e viajante frequente, ela compreende na prática os desafios das famílias modernas.
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